09/10/2009
A (in)dependência do Judiciário

Independência ou morte , teria bradado D. Pedro I para o surgimento do Brasil, às margens do riacho Ipiranga, em 1822. A frase tem significado absolutamente verdadeiro e atual: a vida só faz sentido se for para ser livre.

A independência externa, no entanto, não converte automaticamente o país em pátria livre. Em muitos momentos da história, embora independentes, vivemos períodos de tirania, com a censura aos meios de comunicação e a castração de direitos políticos.

Para que um país viva a liberdade e as instituições funcionem baseadas em princípios de cidadania que moderem o Poder do Estado, é preciso haver um sistema de freios e contrapesos. Assim, já no século 17, Montesquieu lançou as ideias que dominaram o mundo democrático, prevendo a separação dos poderes em Executivo, Legislativo e Judiciário.

Essa separação, até hoje, é a base dos regimes republicanos e se encontra consagrada na nossa Constituição, que prevê o Brasil como um Estado Democrático de Direito, onde os poderes sejam independentes e harmônicos entre si. Todavia, as propagadas autonomia e independência previstas na Carta constitucional são mitigadas por instrumentos que impedem o funcionamento pleno da democracia.

No que diz respeito ao Judiciário, por exemplo, a indicação dos ministros da corte máxima do país o Supremo Tribunal Federal , embora submetida à sabatina do Senado Federal, é ato exclusivo do presidente da República. Assim, não se pode negar que há preponderante influência política em sua composição.

Além disso, na atual composição do STF, apenas um dos 10 ministros é juiz de carreira. Essa notícia certamente soará como surpresa para milhões de brasileiros. Afinal, todos imaginam que, no mais importante tribunal de um país, atuam juízes de formação. Não é isso, contudo, o que ocorre no Brasil.

Portanto, um tribunal que deveria ser técnico e independente justamente para servir de contrapeso, como nos ensinava Montesquieu , acaba tendo uma composição política e pior sem qualquer vivência com a magistratura, justamente a que será por ele representada.

Não se discutem a integridade e a dignidade dos componentes do STF. O que não parece razoável são os atuais critérios do processo de escolha. Para que o Judiciário seja livre e verdadeiramente independente, seus componentes devem ser oriundos da própria carreira da magistratura, para que tenham experiência como juízes e conhecimento das dificuldades próprias da profissão que vão representar.

A escolha deve levar em consideração a postura e ideais de seus membros. Pode-se admitir e é até adequado que isso ocorra a participação dos demais poderes na escolha, mas não é admissível que, como hoje, o próprio Judiciário fique fora disso.

Os tribunais, por exemplo, poderiam apresentar listas de candidaturas com magistrados de carreira. O STF analisaria e faria uma lista com nomes. O Senado poderia reduzi-la a seis e o presidente da República escolheria um deles. Ou vice-versa, pouco importando a ordem do processo de escolha ou o número das listas. O que não se pode aceitar é que o próprio Judiciário não participe do processo de escolha do STF e que os candidatos não sejam da magistratura.

Se alguém quer ser deputado, enfrente as urnas. Quer presidir a OAB, seja advogado. Para ser procurador-geral de Justiça, enfrente a carreira do Ministério Público. Assim, quem pretende chegar a uma Suprema Corte, que percorra a longa e difícil carreira da magistratura. Isso colocaria o trem da República em seus devidos trilhos.

Esse tema, entre outros, será objeto, de debate este mês, em São Paulo, no XX Congresso dos Magistrados Brasileiros, sob o tema Gestão Democrática do Judiciário. Magistrados do Brasil inteiro se reunirão para discutir os rumos que pretendem para o Judiciário, de modo a fazê-lo um poder mais democrático, transparente e com gestão prioritária ao atendimento da coletividade.

Os juízes, enfim, querem se ver representados no órgão de cúpula do poder que integram, sem que a escolha seja individual e política. Afinal, como disse nosso príncipe regente, sem independência verdadeira não há vida. E a morte do Judiciário seria terrível para a cidadania brasileira.

* José Lúcio Munhoz é juiz do Trabalho de Criciúma, vice-presidente da Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) e presidente da Comissão Científica do XX Congresso Brasileiro de Brasileiros.

** Artigo publicado no Correio Braziliense (DF)

Autor:   José Lúcio Munhoz

Ver todos os artigos




© 2024. Todos os Direitos Reservados. AMPB - Associação dos Magistrados da Paraíba

Av. João Machado, Nº 553, Centro, Empresarial Plaza Center, 3º andar, Sala 307, João Pessoa - PB, CEP: 58013-520.
Fone/Fax: (83) 3513-2001
Jornalista Responsável: Jaqueline Medeiros - DRT-PB 1253