14/11/2008
CRIAÇÃO DE SECRETARIA JUDICIÁRIA DE 1º GRAU

            Por muitos anos, em busca de uma tutela jurisdicional tempestiva e efetiva, várias reformas foram feitas no sistema processual, procurando corrigir distorções e adequá-lo às exigências de um processo de massificação de demandas, seja fomentando formas alternativas de solução de conflitos seja disponibilizando instrumentos mais adequados e consentâneos com o tipo de pretensão veiculada.

 

            A par de todas as alterações introduzidas nos últimos dez anos, pouco se fez em relação à parte burocrática de tramitação dos feitos. De fato, a organização cartorária, principal responsável pelo impulso processual, permaneceu seguindo o modelo tradicional consistente na previsão de uma escrivania à disposição de cada juízo.   

 

            Entretanto, esta forma de organização da atividade administrativa de movimentação processual não é a que melhor se compatibiliza com as exigências impostas pela legislação vigente. Não se pode pretender impor celeridade aos feitos sem voltar as atenções para a parte diretamente responsável pelo andamento do feito. Imaginar que a única causa eficiente da demora na tramitação dos processos se deve ao comportamento do magistrado é incorrer em grave erro.

 

            De nada adiantaria ter um juiz eficiente, se o cartório que o auxilia não tem condições de atender a toda aquela demanda. O raciocínio inverso também é verdade: um cartório célere e em dia com suas obrigações teria toda a sua presteza apagada por um juiz ineficiente. Realmente, atribuir poderes ao magistrado para julgar liminarmente improcedente demandas repetitivas (art. 285-A do CPC) e não dar subsídio aos cartórios para agilizar sua tramitação é tornar vazio o comando legal.

 

            Outro fator que contribui sobremaneira para que não haja uma harmonia no prazo de tramitação é o número de feitos em cada vara. Realmente, esta situação leva a que cartórios com menos processos consigam dar cumprimento aos seus deveres em prazo bastante inferior a outros, o que conduz a um baixo aproveitamento de seu potencial. A situação se agrava na medida em que muitas vezes o número de servidores não é suficiente para atender a demanda. Não se precisa de muito esforço para concluir que 7 servidores para atender a 1.000 processos é bastante diferente dos mesmos 7 servidores para movimentar 10.000.

 

            De outra forma, por motivos administrativos, juízes são levados a substituir outros, cumulando atividades em dois juízos. Esta hipótese leva a que os feitos passem a acumular no gabinete do magistrado, esvaziando o cartório e tornando-o ocioso.

 

            Apenas como exemplo, citamos o caso da 3ª Vara Cível onde, segundo levantamento do próprio Tribunal de Justiça, existem 1.614 processos ativos dos quais cerca de 680 feitos encontram-se paralisados no cartório por mais de 30 dias, aguardando movimentação. Em contrapartida, um cartório como a 11ª Vara Cível, com 1.206 processos ativos, tem aproximadamente 26 feitos na mesma situação.

 

            Desse quadro comparativo percebe-se que há uma evidente discrepância no tocante à capacidade de tramitação processual. Veja-se que, enquanto no primeiro cartório o número de feitos paralisados sem movimentação representa uma fração de 42,13% do total de processos ativos no juízo, no segundo exemplo, esta equação corresponde a tão somente 2,1%.

 

Ainda com base no exemplo acima, a conclusão a que se chega é que, do ponto de vista do jurisdicionado, somente aqueles que tiveram a “sorte” de verem seus feitos distribuídos para um cartório enquadrado na segunda situação, poderão gozar dos benefícios de uma tramitação célere, ao passo que aquele que teve sua demanda distribuída para a uma vara na mesma situação da primeira, antes descrita, não terá o mesmo destino. 

 

O exemplo acima descrito serve para demonstrar a evidente discrepância que existe dentro de um único judiciário. Não se justifica que pessoas em situações iguais tenham que se submeter a demoras diferentes.

 

Problema semelhante a este foi enfrentado há pouco tempo atrás quando os mandados de determinado cartório eram cumpridos pelo oficial de justiça vinculado. Essa forma de distribuição dificultava sobremaneira o cumprimento dos mandados em tempo, uma vez que, dependendo do volume de ordens a serem cumpridas, o contingente disponível em cada vara não seria suficiente. A solução, então, foi a criação de uma central para onde seriam distribuídos todos os mandados e lá redistribuídos igualitariamente entre os oficiais de justiça, o que propiciou uma equalização na forma de cumprimento.

 

            A solução seria a criação de uma Secretaria Geral de 1º Grau, capaz de concentrar toda a parte de movimentação processual antes atribuída aos cartórios individualmente. Em contrapartida, para efeitos de distribuição e competência, cada magistrado permaneceria representando um juízo, para onde seriam os feitos conclusos.

 

            A implementação desta secretaria facilmente corrigiria os problemas antes apontados na medida em que todos os processos estariam sujeitos à mesma atividade de tramitação. Em outras palavras, aproveitar-se-ia o tempo ocioso de um cartório para dar impulso aos processos de outro, desconcentrando e perenizando a movimentação dos feitos (equalização da atividade). Este órgão ficaria sob a supervisão de coordenadores sujeitos à livre nomeação e exoneração.

 

            Como se vê, a proposta que se faz aqui não é tão nova como se imagina, basta ver o modelo adotado nas Turmas Recursais, onde várias turmas mantêm-se vinculadas a uma mesma secretaria.

 

            Por óbvio, a organização administrativa dos juízos em Secretarias Gerais dependeria da estrutura do Fórum onde se pretenda implantar o novo sistema. Com efeito, esta forma de organização visa imprimir celeridade na tramitação dos processos em 1º Grau, de modo que não se justifica a criação de uma Secretaria quando o Fórum detenha poucas varas ou mesmo, comporte com eficiência o volume de processos distribuídos.

             

            Ressalto desde já que não há qualquer vício de inconstitucionalidade ou ilegalidade no projeto, já que a iniciativa partiria do Próprio Tribunal de Justiça e, por se tratar de norma sobre Organização Judiciária, seria apreciada pela Câmara Legislativa do Estado, tal como prevê a regra do artigo 125 §1º da Constituição Federal. Do mesmo modo, o CPC, em momento algum, veda a organização interna da forma como ora se propõe.

 

           

           

Márcio Murilo da Cunha Ramos

Desembargador

 

Autor:   Desembargador Márcio Murilo da Cunha Ramos

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