22/10/2012
O aborto, à luz do Direito moderno

O Direito, ciência eminentemente dinâmica, ostenta como fonte geradora e de maior inspiração os próprios fatos sociais; daí passar, constantemente, por radicais mudanças e transformações, no seu campo exegético e interpretativo.

O que ele não admitia, tampouco agasalhava, no passado; começa a assentir, no presente, ante o vertiginoso avanço e crescimento progressivo do conhecimento humano, na sua forma global.

O Decreto-lei nº 2.848, de 07 de dezembro de 1940, já sintonizado com a reforma da Lei nº 7.209, de 11 de julho de 1984 - Código Penal brasileiro; no seu artigo 124 e ss., faz um minucioso estudo do delito do aborto, situando-o como se vê, nos seus artigos e clássicos desdobramentos: a)-aborto provocado pela gestante ou com seu consentimento; b)-aborto provocado por terceiro; c)-forma qualificada; d)-aborto necessário e e)-aborto no caso de gravidez resultante de estupro.

Desnecessário seria proclamar, que a legislação positiva penal pátria atribui a cada uma dessas modalidades de aborto uma expiação própria; algumas delas, em tese, parcialmente abominadas pelo citado Digesto.

Condicionado a cada caso concreto e tema em debate, vislumbra o Direito Moderno, contando, para isso, com a imperiosa cooperação da própria Medicina, num elo de indissociável interação, avantajada possibilidade de remeter a teoria tradicional do aborto ao escaninho do desuso e do esquecimento.

Originário dos E.U.A. e da Europa, têm chegado ao nosso país testes avançados para a detecção de anomalias e defeitos genéticos na fase pré-natal; deformidades essas e tais que, começam, já, a revolucionar o universo jurídico brasileiro, na diretriz precisa e segura de que possa admitir-se, doravante, a prática do aborto sem qualquer penalização para a mulher que dele faça uso, por iniciativa própria, ou mesmo com o auxílio imprescindível de pessoa habilitada para o mister, no caso, o próprio médico.

Criminalistas brasileiros, escudados em aprofundados estudos e cansativas pesquisas científicas, na esfera específica de pontificação, conforme publicidade ostensiva na imprensa nacional; chegam a enfatizar que "o Brasil entrou na era dos bebês encomendados, isto é, dos fetos examinados ainda no útero da mãe, para a detecção de anomalias genéticas".

E mais: "o problema, agora, é como fazer com que as gestantes, ou mesmo pais que planejam um filho, cheguem a eles, e o que fazem depois de um exame que indicou uma doença que pode incapacitar a futura criança para sempre, ou que a mate em algumas horas, semanas ou meses depois de nascida".

Finalmente: "nesses diagnósticos pré-matais é possível saber, a partir da 12ª semana da gravidez, os riscos de o feto ter alguns desses problemas".

"Alguns deles exigem um procedimento invasivo - uma agulha ou catéter são introduzidos no abdômen da gestante, implicando tudo isso em procedimento de risco pequeno, mas não negligenciável, de aborto".

Segundo esses mesmos pensadores do Direito Moderno, com base e supedâneo da Medicina, o exame mais recente e sem riscos é o da translucência nucal; pesquisa essa consistente na mensuração da nuca da gestante; inferindo-se exatamente dele que uma mulher de 30 (trinta) anos tem 1,6% de ter um filho com alguma anomalia genética - como a síndrome de Down.

Com o advento da translucência nucal e o seu resultante efeito positivo, surgem mais dois testes, numa prova inequívoca de que a matéria colacionada à discussão, repercute, não só no campo empírico, mas, sobretudo, no campo prático: o BVS, a biópsia das vilosidades coriônicas e a chamada amniocentese; consoante os quais é perfeitamente possível visualizar-se qualquer "monstruosidade fetal", ainda no útero materno; de molde a influenciar diretamente a genetriz a não expurgá-lo ou tê-lo, até porque estanques e sem qualquer valia os diminutos e pequeníssimos instantes de vida do deformado ente.

Para o procedimento de tais testes, objetivando, especificamente, a interrupção da gravidez, imperiosa faz-se a prestação jurisdicional, com a postulação da parte diretamente interessada, pela via apropriada e eleita do alvará, já concedidos à ordem e número de 350 (trezentos e cinqüenta) pela própria justiça brasileira.
O comportamento social da mulher que se vê estigmatizada por tais anomalias e deformidades, visando a paralisação da formação embrionária do filho ou da filha defeituosos, não fica à sua mercê, mas da própria Justiça, único órgão com atribuição e competência, em caráter de excepcionalidade, de legalizar o fato outrora reputado aético e, por isso mesmo, criminoso.

Os pretórios, na sua modalidade de agrupamentos coletivos, além de os juízos singulares, como se vê, propendem a não mais ergastular aqueles incidentes em tal crime; ante o avanço do Direito Positivo, neste início do Terceiro Milênio.

Matéria, portanto, em pauta, para deslinde e discussão.

 

Autor:   Osvaldo Duda, magistrado aposentado.

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