29/02/2008
Juízes de Campina Grande sob suspeição
O Tribunal de Justiça deverá apreciar dia 12 o susposto envolvimento de quatro juízes
Clóvis Gaião
clovisgaiao@jornalonorte.com.br
O Tribunal de Justiça da Paraíba deverá apreciar no próximo dia 12 o suposto envolvimento de quatro juízes de Campina Grande e advogados com um esquema de execução de multas "astronômicas" contra bancos e empresas de grande porte do Estado. O esquema, que criou uma verdadeira "indústria de multas" nas Varas Cíveis de Campina Grande havia sido divulgado com exclusividade pelo Jornal no dia 27 de outubro de 2007 e o fato vem à tona novamente com o pedido do corregedor geral de Justiça, desembargador Júlio Paulo Neto, para que o processo entre na pauta da próxima sessão administrativa do Pleno.
O esquema teria liberado mais de R$ 20 milhões em multas e indenizações, conforme denúncias feitas por advogados de grandes empresas ao Ministério Público do Estado. O corregedor geral de Justiça, Júlio Paulo Neto, confirmou a conclusão da correição realizada "in loco" durante mais de 1 mês, onde foram analisados 20 mil processos que levaram os corregedores a concluírem sobre a procedência de parte das denúncias.
A principal constatação da Corregedoria foi um excesso de fixação de astreinte-fixação de multa cominatórias nos processos judiciais em benefício dos próprios juízes e de advogados das partes. "Essa prática, de acordo com o corregedor Júlio Paulo Neto, foi verificada em quatro Varas Cíveis de Campina Grande". Juntos, de acordo com a correição, eles acataram dezenas de ações que resultaram em multas acima do normal, concedidas de forma célere, diferentemente do que geralmente acontece para o cidadão comum que utiliza a justiça brasileira.
O corregedor Júlio Paulo Neto ressaltou que as sanções para esses casos estão previstas na Lei Organização Judiciária do Estado, em seu artigo159, que prevê penas disciplinares como advertência, censura, remoção compulsória, disponibilidade com vencimentos proporcionais ao tempo de serviço e perda do cargo para as faltas cometidas.
As provas estão nos autos do inquérito e acredito que Pleno do Tribunal de Justiça vai decidir sobre o caminho que vai tomar. É importante ressaltar que durante o processo os acusados terão amplo direito de defesa" afirmou.
Sentenças de uma linha e despachos em trinta minutos
O relatório da correição extraordinária demonstra que a indústria de multas na justiça de Campina Grande proporcionava que o ganhador da causa tivesse conhecimento do despacho para execução da multa e, em menos de 30 minutos, recebesse o alvará para liberação do dinheiro. Isso pode ser verificado na ação 001.2006.015.533-8, que resultou na execução de multa cominatória de R$ 76 mil. O despacho que deferiu a liberação foi de 28 de agosto de 2007, mesma data do alvará para a liberação e a entrega do dinheiro. Neste caso, segundo o relatório, mais entranho do que uma sentença ser entregue em cartório num dia e, pouco minutos depois, o advogado já apareça com a petição tecnicamente correta pedindo a liberação é o fato da petição ser deferida e o dinheiro levantado em poucas horas.
Sentenciada pela mesma juíza, a ação 001.2005.018.068-4 também chamou atenção da Corregedoria pelo despacho lacônico -resumida em apenas uma linha - que a juíza deu para garantir a execução da multa e liberação do dinheiro. "Defiro o pedido de fls.198/200. Intime-se na forma requerida". Em outro processo 001.2004.025.147-0 a indenização por dano moral ficada por um dos juízes contra uma empresa foi de R$ 400 mil, sendo posteriormente reduzida para R$ 40 mil pelo Tribunal de Justiça.
Associação estranha a divulgação de relatório
O presidente da Associação dos Magistrados do Estado da Paraíba, Marcos Sales, estranhou o fato do relatório da Corregedoria ter sido divulgado antes do processo ser encaminhado ao Tribunal de Justiça. "Se a Corregedoria tem poderes para fiscalizar os juízes e até mesmo estabelecer punição ao Tribunal de Justiça deve ter a prudência de que a corte se manifeste como um todo. Até como forma de garantir um direito constitucional de todo brasileiro que é a presunção de inocência", explicou Sales.
Sobre a postura adotada pelos quatro magistrados de Campina Grande, Marcos Sales preferiu não emitir juízo de valor e acrescentou que o processo apenas poderá começar se o Tribunal entender que há índicos de culpa submetendo os acusados a um procedimento administrativo. Sendo comprovado as irregularidades, a Associação dos magistrados quer que o Tribunal investigue e puna os culpados. "É inadmissível que uma autoridade judiciária se submeta a esse tipo de julgamento", concluiu.